Graça Entre Pessoas
O escritor aos Hebreus nos diz: “Pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hebreus 4:15).
A maioria dos cristãos está familiarizada com este versículo. Ele diz que o nosso sumo sacerdote, Jesus, sente o sofrimento junto conosco. Em grego a palavra compadecer-se aqui significa “ter simpatia, resultante de experimentar o mesmo tipo de sofrimento.” Em outras palavras, o Senhor se compadece pessoalmente por toda calamidade, dor, perturbação e desespero que nos sobrevem. Não há nada que tenhamos experimentado que Ele não tenha suportado também, de um jeito ou de outro.
Pelo fato de termos tal sumo sacerdote, somos instruídos: “Cheguemo-nos, pois, com confiança ao trono da graça, para que recebamos misericórdia e achemos graça, a fim de sermos socorridos no momento oportuno” (Hebreus 4:16). Ou seja, “ seu Salvador sabe exatamente o que você está enfrentado, e Ele sabe exatamente como lhe ministrar Sua graça.” A minha pergunta é: na hora de grande necessidade, como vamos “achar graça”, como Hebreus sugere?
Já ouvi a maioria das definições teológicas sobre graça: favor não merecido, bondade de Deus, Seu amor especial. Mas a graça ganhou um significado diferente para mim dezembro passado, quando minha neta Tiffany, de onze anos, fez exames para pesquisar um possível tumor cerebral. A minha esposa Gwen e eu, estávamos no hospital com nossa filha Debbie, e seu marido Roger, no dia que os médicos fizeram os exames em nossa amada neta. Enquanto esperávamos para saber o resultado, a única coisa que podíamos fazer era orar pedindo graça.
Tudo tinha acontecido tão rápido. Um dia atrás Debbie e Roger tinham nos telefonado para que orássemos pois estavam levando Tiffany ao médico. Ela tinha tido muita dor de cabeça, e estava começando a sangrar pelo olho. Quando desligamos o fone, eu disse para Gwen: “A vida é tão frágil. Um simples telefonema pode provocar a maior desordem.”
No dia seguinte, chegando ao hospital em Virgínia, Gwen e eu vimos pais desesperados pelos corredores. Mostravam preocupação e se juntavam em grupos, diante da possibilidade de ter más notícias quanto aos filhos. Muitas vezes, quando a palavra terrível chegava - “é maligno” - alguns gritavam desesperados, totalmente arrasados.
Enquanto todos aguardávamos para ouvir o resultado dos exames de Tiffany, orei silenciosamente pedindo força para aceitar o veredicto, fosse qual fosse. Naquela hora não me importava qual era o significado teológico de graça. Para mim significava ter a paz de Deus, e poder receber qualquer notícia sem entrar em pânico. Orei: “Senhor, sabemos que fazes tudo certo. Colocamos nossa confiança em Ti. Não permitas que pequemos com nossos lábios. Dê-nos da Tua graça para que possamos suportar isso”.
E aí veio a enxurrada violenta de notícias ruins: Tiffany tinha um enorme tumor, um dos mais graves. Era maligno.
Eu tinha ouvido esta terrível palavra “maligno” oito vezes. Gwen, Debbie, e nossa filha mais nova, Bonnie, todas enfrentaram o câncer. Graças a Deus, elas sobreviveram à cada uma dessas experiências terríveis. Mesmo assim, cada vez que chegava esse resultado pavoroso, era a pior coisa que alguém poderia me dizer. Não consigo exprimir o que Gwen e eu passamos naquele instante com nossa neta, Tiffany. O que sei é que a dor me levou ao livro de Jó.
Jó era um homem piedoso, com uma família muito unida. Ele e a esposa tinham dez filhos adultos, sete netos e três filhas. Ele orava diariamente pelos filhos, e oferecia holocaustos por eles “pensando: Talvez os meus filhos tenham pecado, e blasfemado contra Deus no seu coração. Assim fazia Jó continuamente” (Jó 1:5).
Jó não tinha idéia do que estava acontecendo no céu naquela hora entre Deus e Satanás. Ele não recebeu nenhum aviso das calamidades repentinas que cairiam sobre sua família. E a Bíblia pinta uma cena terrível: no período de um só dia, Jó perdeu não só os servos e propriedades, como também todos seus dez filhos morreram devido à desastres naturais (v. Jó 1: 13-22).
Tente imaginar as trágicas perdas de Jó e de sua mulher. Em poucas horas tudo que lhes era precioso foi varrido de suas vidas: cada um de seus amados filhos e filhas, todos os servos e empregados que lhes eram caros. Mesmo em sua imensa dor e angústia, Jó escolheu reagir segundo a alternativa certa; sua sofredora esposa optou pela alternativa errada.
A esposa de Jó deve ter se amargurado quando entreouviu o mensageiro dizendo: “Fogo de Deus caiu do céu e queimou...e consumiu...” (Jó 1:16). Na hora que estas terríveis notícias entraram em sua cabeça, ela se recusou a ser consolada. E tolamente acusou a Deus e encorajou o esposo: “Amaldiçoa a Deus, e morre” (2:9). Ou seja “Qual o motivo de o Senhor ter trazido uma tragédia destas sobre uma família tão consagrada?”
Pessoalmente, não culpo a esposa de Jó por sua reação. Se tivesse perdido todos os meus filhos e amados numa só tarde, eu poderia encontrar meu coração nas mesmas condições do dela. Acho que na hora que aquelas notícias terríveis chegaram, a mulher de Jó simplesmente morreu por dentro; ela ainda estava fisicamente viva, mas no coração, já havia acabado.
Além disso, ainda outra terrível tragédia estava por vir: em seguida o esposo ficou coberto de bolhas dolorosas, da cabeça aos pés. Jó se assentava sobre um monte de cinzas e se esfregava com cacos de telha para aliviar a dor. Só de ver o quadro repugnante deste homem, as pessoas se afastavam horrorizadas. Nem os amigos de Jó o reconheceram a princípio; mesmo depois de o reconhecerem foram incapazes de lhe olhar. Eles se assentaram longe dele, tristes e lamentando o que havia acontecido com o amigo.
Enquanto isso, a mulher de Jó deve ter ficado totalmente anestesiada. As lembranças das alegres reuniões de família, as esperanças para o futuro - tudo tinha desmoronado. Seu mundo tinha caído. Ela nunca teria outra vez aquela alegria, aquelas esperanças. Tudo dentro dela tinha acabado: o amor, a esperança, a fé. E a raiva e a incredulidade encheram sua alma.
Jó também sofria profundamente. Ele precisava muito de uma palavra de conforto. Mas ao invés disso, sua mulher o despedaçava ainda mais, dizendo: “Ainda conservas a tua integridade?” Duas coisas se inferem a partir das cortantes palavras desta mulher em desespero. Primeiro ela pergunta: “Que terrível pecado você cometeu, Jó, para trazer um julgamento tão terrível da parte de Deus sobre nós? Não tente me convencer que você ainda é um homem íntegro.”
Segundo, ela inferia: “Então é assim que Deus trata uma família justa? Há anos que temos nossa devocional diante do altar todos os dias; temos andado perfeitos diante do Senhor; temos usado da nossa abundância para abençoar os pobres. Por que Deus nos roubou tudo que nos era precioso? Não posso servir um Deus que permite que isto aconteça.”
E então esta mulher perturbada proferiu as terríveis palavras: “Amaldiçoa a Deus, e morre” (2:9). Ela estava assumindo: “Já estou morta, Jó. Não sobrou nada. É melhor morrer do que não ter os nossos filhos. Então, vamos lá: amaldiçoe a Deus, e morra junto comigo.”
A situação desta mulher ilustra a cruel guerra que travamos com o inimigo, quando uma tragédia acontece. Vi esta guerra recentemente em uma jovem que estava ao meu lado num avião. Notei que ela estava chorando em silêncio; então disse-lhe que eu era ministro e perguntei se podia ajudar. Ela respondeu: “Senhor, simplesmente não posso crer no teu Deus.”
Ela contou que o pai tinha morrido de repente; o descreveu como um homem bom, que sempre tinha dado do que era seu para ajudar os outros. E, em meio à lágrimas de amargura, a jovem diz: “Não posso crer num Deus que possa matar um bom pai no melhor momento da vida.” Ela tinha escolhido a terrível alternativa da mulher de Jó: culpava Deus, e agora se afundava no desespero. Mesmo viva fisicamente, por dentro estava acabada.
Apesar de que “a dor era muito grande” (Jó 2:13) para Jó, ele confiou em Deus em meio ao sofrimento e à aflição. Assim como sua sofrida esposa, ele também desejou morrer. O desespero era tão avassalador, que desejou nunca ter nascido. Contudo, em meio a tudo isto, Jó declara: “Ainda que ele me mate, contudo nele esperarei” (Jó 13:15).
Jó basicamente estava dizendo o seguinte: “Não importa que estas chagas malignas me levem ao túmulo. Irei confiando no Senhor. Jamais abandonarei a crença de que Ele sabe o que está fazendo. Apesar de eu não estar entendendo esta tragédia, sei que Deus tem um propósito eterno. Mesmo que Ele resolva me matar, confiarei nEle até meu último suspiro.”
Semelhante a Davi, eu já expressei minha dor a ponto de derramar lágrimas. Davi escreve: “Quem me dera ter asas como de pomba! Voaria, e estaria em descanso...longe da fúria do vento e da tempestade” (Salmo 55:6,8). Porém devo admitir, nunca vivi uma dor como a de Jó. Nunca cheguei ao ponto de desejar morrer.
Naquele hospital de Virgínia, Gwen e eu vimos exemplos dos dois tipos de reação. Os casos eram trágicos: uma criança de dois anos tinha caído de vinte e um andares e estava sendo tratada de traumatismo de crânio. Outro bebê em estado grave tinha chegado às pressas trazido por um helicóptero. Uma menininha frágil, pálida e fraca, passava por nós com o soro ligado à veia. Uma outra garotinha mostrava confusão mental, falando sem controle.
Na maioria das vezes, conseguíamos dizer quando os pais daquelas crianças em sofrimento eram cristãos ou não. Passando por alguns quartos, sentíamos uma grande paz. Nestes casos, percebíamos o poder sustentador de Deus em ação, e os pais se amparavam e descansavam na palavra de Deus.
Mas em outros quartos, havia um caos e uma agitação absolutos. Podíamos realmente sentir a desesperança dos pais. Culpavam a Deus, e perguntavam: “Por que um Deus bom permite isso?” Eles ficavam andando pelos corredores, se perguntando em meio á revolta: “Por que, por que, por que?”
Quando a calamidade chega, você precisa fazer uma escolha. Você pode ficar com raiva de Deus, e ficar perguntando: “Por que?” Ou então, pode dizer: “Senhor, não importa o que aconteça, sei que tens o poder e a graça para me sustentar.”
Como seguidores de Jesus, simplesmente temos de correr até o nosso sumo sacerdote, para recebermos misericórdia e consolo do Espírito Santo. E temos de confiar na onisciente graça de Deus. Às vezes poderemos chorar, sofrer e desejar morrer; poderemos ficar sem dormir, e ficar com a cabeça fervendo de tantas perguntas. Mesmo assim, Deus permitirá que passemos por todas estas coisas. Elas são parte do Seu processo de cura.
Mas como, exatamente, encontramos a graça de Deus para que ela nos ajude na hora de necessidade? Como essa graça nos é dispensada? No meio da crise, não vamos querer ficar dependentes de definições teológicas meio obscuras. Vamos precisar de uma ajuda muito realista da parte de Deus. Como vamos receber esta graça no coração, na alma, em nosso corpo físico na hora da dor?
Creio que recebemos o toque da graça de Deus através de pelo menos duas maneiras maravilhosas:
Por todas as escrituras, as maiores revelações da bondade de Deus vieram às pessoas nas horas de turbulência, calamidade, isolamento e lutas. Encontramos um exemplo disto na vida de João. Por três anos, este discípulo ficou junto ao “seio de Jesus”; foi um tempo de descanso, paz e alegria absolutos. Contudo, durante todo este período, João recebeu muito pouca revelação. Ele conhecia Jesus só como o Filho do homem. Então, quando João recebeu a revelação de Cristo em toda Sua glória?
Isto aconteceu só quando João foi arrastado de Éfeso acorrentado. Ele foi exilado à Ilha de Patmos, para onde foi condenado a trabalhos forçados; ficou isolado, sem companhia, sem familiares ou amigos para lhe confortar. Foi uma época de desespero total, o período mais terrível de sua vida.
No entanto, foi nesse período que João recebeu revelação da parte do Senhor, daquele que seria o elemento final das escrituras: o livro do Apocalipse. Em meio à essa hora sombria, a luz do Espírito Santo veio até ele. E João viu Jesus como nunca O tinha visto. Ele literalmente viu Cristo como o Filho de Deus.
João nunca tinha recebido essa revelação enquanto estava com os outros apóstolos, ou mesmo durante os dias de Jesus na terra. Porém agora, em seu período mais negro, João vê Cristo em toda a Sua glória, declarando: “Eu sou o que vivo; fui morto, mas estou vivo para todo o sempre!” (Apocalipse 1:18). Esta tremenda revelação coloca João dobrado sobre seu rosto. Mas Jesus o levanta e lhe mostra as chaves que tinha nas mãos. E acalma João: “Não temas” (Apocalipse 1:17).
Creio que esta revelação vem a todo homem ou mulher de oração que estiver em sofrimento, na hora de necessidade. O Espírito Santo diz: “Jesus tem as chaves da vida e da morte. Então, a partida de cada pessoa repousa em Suas mãos. Portanto, Satanás jamais poderá lhe levar ou a qualquer membro de sua família. Unicamente Cristo determina o nosso destino eterno. Logo, se Ele gira uma chave, há uma razão para isso. E esta razão só é conhecida por Ele, pelo Pai e pelo Espírito Santo.”
Esta revelação tem o objetivo de trazer paz ao nosso coração. Como João, devemos visualizar Jesus à nossa frente, segurando as chaves da vida e da morte, nos assegurando: “Não tenha medo. Tenho todas as chaves.” Qual deve ser a nossa resposta? Tal como Jó, devemos dizer em fé: “O Senhor o deu e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21).
Um pastor com problemas escreveu o seguinte: “Há quinze anos atrás a minha esposa teve câncer dos seios. Agora, tem câncer de pâncreas. Talvez tenha de ficar numa casa de repouso. Por quarenta anos estivemos envolvidos na obra do Senhor. Eu fico pensando, todo este trabalho foi em vão? Isso não conta para nada? Será que Deus não vai nos dar uma folga?”
Digo a este amado irmão: creio que neste exato instante, na hora mais sombria de sua vida, Jesus quer revelar em você a Sua Divindade. Sim, você está sofrendo terrivelmente. Mas se confiar nEle em meio à dor, lhe virá uma revelação que abrirá seus olhos à coisas que você nunca viu, ou compreendeu. E você será usado pelo Senhor para ajudar muitos outros.
A Bíblia nos diz que Jacó recebeu uma incrível revelação, através de um encontro face à face com Deus: “Jacó chamou àquele lugar Peniel, pois disse: Vi a Deus face a face, e a minha vida foi poupada” (Gênesis 32:30). Quais circunstâncias cercavam esta revelação? Foi a fase mais assustadora e deprimente da vida de Jacó. Nesta época, ele estava no meio de duas forças poderosas: o sogro enfurecido, Labão, e seu hostil e amargo irmão, Esaú.
Jacó tinha trabalhado por mais de vinte anos para Labão, que o tinha enganado várias vezes. Finalmente, Jacó chegou ao limite. Então, sem avisar Labão, ele pegou a família e fugiu.
Labão partiu do leste em sua perseguição com um pequeno exército, pronto para matar Jacó. Assim, só quando Deus avisou Labão em sonhos para não atacar Jacó, foi que este homem permitiu que o genro se fosse. Labão nem bem tinha saído de cena, quando vem Esau do oeste. Ele também dirige um pequeno exército de cerca de 400 homens, pronto para matar o irmão pelo roubo da primogenitura.
Jacó enfrentava um terror absoluto, convencido que estava prestes a perder tudo. A situação parecia desesperadora. Mesmo assim nesta hora de trevas, Jacó teve um encontro com Deus como nunca tinha tido antes. Ele lutou com um anjo que os estudiosos crêem ser o próprio Senhor. E depois disso disse: “Vi a Deus face a face, e a minha vida foi poupada” (Gênesis 32:30).
Agora voltemos para Jó. Ele também tinha chegado ao pior momento de sua vida. Ele tinha passado sofrimento atroz, dor física alucinante e sofrido rejeição completa por parte dos amigos. E então, na pior hora, Deus lhe aparece num redemoinho de vento. E o Senhor concede a este homem uma das maiores revelações sobre Si jamais testemunhada por um ser humano.
Deus leva Jó para o cosmos, e a seguir para as profundezas do mares. Carrega-o para a intimidade dos segredos da criação. E Jó viu coisas que ninguém tinha visto. Foi lhe mostrada a glória e a majestade absolutas de Deus. Jó sai desta experiência louvando a Deus, dizendo: “Eu sei que tudo podes; nenhum dos teus planos pode ser impedido. Quem é aquele, perguntaste, que sem conhecimento encobre o conselho? Certamente falei do que não entendia, coisas maravilhosas demais para mim, e que eu não compreendia. Escuta-me, disseste, e eu falarei; eu te perguntarei e tu me responderás. Com os ouvidos eu ouvira falar de ti, mas agora te vêem os meus olhos” (Jó 42: 2-5).
Algo maravilhoso ocorre quando confiamos simplesmente. Uma paz vem sobre nós, nos capacitando a dizer: “Não importa o que virá desta terrível experiência: o meu Deus tem tudo sob controle. Não há o que temer.”
Você pode dizer: “Mas prefiro deixar Deus resolver tudo, e me tirar o sofrimento e a dor. Vou ficar muito feliz com menos revelação.” Não, a revelação que lhe chega é destinada a lhe prover mais do que reconforto apenas. Tem por objetivo lhe tornar um doador da graça, para conceder a graça curadora de Deus para outros.
Deus muitas vezes usa anjos para ministrar às pessoas. Mas na maioria das vezes, usa Seus filhos, quando são cuidadosos com os outros, para dispensar Sua graça. Essa é uma das razões de sermos feitos co-participantes da Sua graça: nos tornarmos canais dela. Somos designados para dispensá-la aos outros. Chamo isso de “graça entre pessoas.”
“Mas a graça foi dada a cada um de nós segundo a medida do dom de Cristo” (Efésios 4:7). Por causa do conforto que nos é concedido através da graça de Deus, é impossível a qualquer um de nós continuar sofrendo a vida toda. Chega uma hora, à medida que recebemos a cura de Deus, em que começamos a formar um depósito da graça de Deus.
Acho que é isso que Paulo quis dizer quando escreveu: “Fui feito ministro deste evangelho, segundo o dom da graça de Deus, que me foi dado...de anunciar entre os gentios...as riquezas insondáveis de Cristo” (Efes. 3:7-8). “Todos vós fostes participantes da minha graça” (Filipenses 1:7). O apóstolo está fazendo uma declaração profunda; está dizendo: “Quando vou ao trono de Deus para obter graça, faço isso em favor de vocês. Desejo ser-lhes um pastor misericordioso, e não crítico. Quero estar capacitado a lhes dispensar graça na hora que precisarem dela.” A graça de Deus tornou Paulo um pastor cheio de compaixão, capaz de chorar junto com os que sofriam.
Pedro escreve: “Servi uns aos outros conforme o dom que cada um recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus” (I Pe. 4:10). O que significa ser um bom despenseiro da multiforme graça? Será que sou assim? Ou será que gasto o tempo orando só pela minha dor, por meus sofrimentos e lutas?
Quando estávamos no hospital com Tiffany, vimos a “graça entre pessoas” de Deus em ação. Debbie e Roger estavam inundados do amor vindo da congregação à qual pertencem. A sustentação que estes santos, conduzidos por seu piedoso pastor e esposa, dão à nossa família é impressionante. A graça fluía de todas as direções: pessoas traziam as refeições para Debbie e Roger; outros traziam bichinhos de pelúcia para Tiffany. Um grupo disse: “Não queremos incomodar. Só viemos orar.” Então ficaram ao lado do quarto de Tiffany e intercederam.
Vi a mesma graça entre pessoas fluindo da Igreja de Times Square quando voltamos para casa. O pastor Carter Conlon tinha deixado uma mensagem em nossa secretária eletrônica dizendo: “David e Gwen, nos lhes amamos. A igreja está jejuando e orando por Tiffany.” Mais tarde, ao andar pelas ruas, me sentindo pesaroso e sofrendo, o nosso pastor Neil Rhodes me viu. Ele parou e disse: “Pastor David, o senhor e sua família são tão amados. Todos nós estamos ao seu lado.” O meu espírito se ergueu, através da graça que me foi dada.
Vi essa mesma graça entre pessoas na sala de espera daquele hospital. Enquanto conversava com Roger e Debbie sobre a operação de Tiffany, uma mãe transtornada chegou, e sentou-se no sofá, com aparência totalmente derrotada. Quando lhe perguntei qual seria o problema, disse: “O fígado do meu filho de quinze anos parou de funcionar há algumas semanas. Se não receber um transplante, não viverá mais que alguns dias.”
Perguntei se podíamos orar por ela. Ela disse que sim, e então comecei a orar. Depois de mais ou menos um minuto, porém, senti certa agitação, então parei e olhei. Debbie estava sentada ao lado da mãe. Elas se abraçavam fortemente - e choravam juntas, confortando-se reciprocamente.
Aí Debbie começou a orar pela mulher. Eu sabia que a oração vinha do coração de minha filha, e compreendi que estava testemunhando uma verdadeira graça entre pessoas. Minha filha e a sofrida senhora se juntavam no abraço de uma dor que dividiam.
Amado, o nosso sofrimento atual está produzindo algo precioso em nossas vidas. Está formando em nós um clamor de misericórdia e graça, para oferecer aos que sofrem. O nosso sofrimento faz com que desejemos ser doadores da graça.
Acho que é por isso que fiquei tão perturbado ao ler o livro de Jó há pouco. Me zanguei ao ver o jeito terrível com que os assim chamados amigos de Jó o trataram em meio à sua dor. Em página por página da minha Bíblia fui escrevendo “Que crueldade! Que horrível!” Essas pessoas diziam para Jó: “se fores puro e reto, certamente logo despertará (Deus) em teu favor, e te restaurará à tua justa morada” (Jó 8:6). “Você esqueceu Deus, Jó. Você é hipócrita”(v. 8:13). “Você está cheio de conversa fiada e de mentiras” (v. 11:2-3). “Você está colhendo menos do que merece em razão do seu pecado” (v. 11:6).
Há poucos meses atrás eu trouxe uma mensagem intitulada “Você Não Tem de Compreender Suas Aflições - Você Tem a Graça.” Depois disso, recebi várias cartas ofensivas da parte dos leitores. Elas diziam basicamente: “Não quero mais receber seus sermões. Talvez você não compreenda porque sofre tanto, mas eu sei. Você não tem fé. Não quero me envolver com este tipo de evangelho. Você deveria ter poder contra as aflições.”
Obviamente estas cartas não foram enviadas no Espírito de Cristo; elas simplesmente não eram marcadas pela graça e pela compaixão que caracterizam nosso Senhor. Há pessoas que efetivamente têm uma espécie de cruel satisfação no sofrimento dos outros. Quando Debbie teve de passar pela primeira luta com o câncer, os líderes da igreja que ela freqüentava pediram que ela deixasse a igreja. Disseram: “Você não está sendo um testemunho do poder curativo de Deus.”
Este tipo de palavra ofensiva me faz bradar com Paulo: “Senhor, me torne um doador da graça. Que eu possa experimentar a Tua misericórdia, para que a possa mostrar aos demais.”
Não tenho raiva de nenhuma dessas pobres e iludidas almas. Sei que, tristemente, chegará a hora em que elas enfrentarão sua própria hora de calamidade e de dor. E não terão nenhum recurso interior para tratar disso.
Jó, por outro lado, se tornou um doador da graça. Por ter mantido a confiança em Deus durante todo o tempo, foi capaz de dar graça à sua amarga esposa. Isso se torna ainda mais notável, quando se entende o estado mortificado em que ela se encontrava. Se você estivesse presente na hora em que ela ouviu a terrível notícia sobre os filhos, iria pensar: “Ela nunca vai sair dessa. Ela nunca mais vai sorrir, ou ter uma vida normal outra vez.”
No entanto, não demorou muito para que a alegria e o riso enchessem seu lar de novo. Ela viu o marido se curar da doença. E teve mais dez crianças: sete filhos e três filhas, bem como era antes. Tudo foi restaurado, e ainda mais.
Jó e a esposa deram o nome de Jemima à primeira filha, que significa “pombinha calorosa e cheia de amor”. Veja o retrato da graça de Deus: a mesma mulher que tinha dito para o marido amaldiçoar a Deus, estava agora sendo abençoada com uma adorável pombinha que trouxe paz ao lar.
A esposa de Jó não só voltou à vida, como também sorriu e se alegrou outra vez. Obviamente, nunca esqueceu o passado. Mas agora todo um mundo novo de bênçãos e de alegria lhe foi aberto. E o justo Jó viveu outros 140 anos. As escrituras dizem que este piedoso homem viveu para ver “seus filhos, e aos filhos dos seus filhos, até a quarta geração” (Jó 42:16).
A palavra de Deus nos assegura: “O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã” (Salmo 30:5). E tudo acontece pela graça!